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13 de mar. de 2013

30 dias de paganismo – Dia 05: Cosmogonia

   Uma das principais dificuldades para quem começa a estudar sobre mitologia egípcia é justamente compreender a cosmogonia.Afinal, não há uma linearidade como a que vemos, por exemplo, nos mitos gregos. As fontes são diversas, as divindades mudam e os próprios conceitos de criação, também.
    As principais cosmogonias que encontramos referência são as das cidades de Heliópolis, Tebas, Hermópolis e Mênfis.Todas diferem entre si e ao mesmo tempo possuem elementos em comum. Um dos pontos em comum é que a criação tem início nas águas de Nun, o oceano primordial. Daí surge o Netjeru que inicia o processo de criação com dois novos elementos (terra e céu por exemplo) das maneiras mais variadas possíveis. Cada um dos novos elementos criados é também um Netjeru ou Netjeret, que juntos criam mais dois novos Netjeru/elementos e assim sucessivamente até chegarmos aos humanos. Em alguns mitos, Ptah criou os humanos, já em outros foi Khnum, em outros foi Ra.
    O que é preciso ter em mente, para não pirar de vez quando se começa a pensar nas diferentes cosmogonias é que elas variam em função de geografia e período de tempo. A história nos mostra que por momentos elas até foram contemporâneas umas das outras. Porém, é preciso diferenciar a maneira como encaramos isso hoje, com a visão do todo, com a da época do Egito Antigo, onde existiam restrições espaço-temporais.
     Atualmente abrimos um livro de história e lá está toda a linha de tempo do Egito desde o início até a Primavera Árabe de 2011 com nomes, datas, locais e fatos – mas isso não ocorria com os antigos da mesma forma. Este apanhado de informações que os livros nos mostram estava sendo vivido por eles na época ou então nem tinha acontecido ainda. E outra: as diferenças tecnológicas de acesso à informação nem se comparam.
   Como eu disse, houve momentos em que diferentes cosmogonias foram contemporâneas. Mas, diferentemente do que se possa pensar em um primeiro instante, haja vista tantos conflitos religiosos, os egípcios as encaravam de um modo bem peculiar. Para eles, todas as cosmogonias são verdadeiras. Os conflitos religiosos que temos registro em sua maioria tiveram como pano de fundo transições políticas (como o caso das tranformações de estátuas de Seth em Amun, por exemplo).
   Então é isso mesmo: todas as cosmogonias são verdadeiras – e é assim que encaramos hoje. A cosmogonia dentro da ortodoxia kemética trabalha com lógica polivalente e sem henoteísmo – ou seja, todos os pontos de vista são válidos e não temos uma divindade superior às outras. Por isso, tanto o ciclo de criação de Ptah quanto de Ra, por exemplo, embora originados de locais e épocas diferentes são aceitos.
  Mente aberta, para ser kemético ortodoxo, como se vê, é praticamente obrigatório. Se por algum motivo alguém não assimila a lógica polivalente, fica muito difícil se sintonizar e se achar, principalmente nesta parte mais ampla de cosmogonia. Sabem o lema de magia do Caos, “nada é verdadeiro, tudo é permitido” ? Para começar com cosmogonia, é mais ou menos por aí...

26 de fev. de 2013

Relações perigosas

Em um debate com alguns de meus camaradas reconstrucionistas, falávamos sobre as relações entre mães e filhos. Alguns colocaram que para muitos, aqui no Brasil, "sair do armário pagão" via de regra causa um tumulto - nem sempre com a mãe, mas com a família - em algum nível. Alguns são zoados, outros perseguidos, outros ainda sofrem com punições, chantagens e por aí vai.

Sou uma dessas pessoas de exceções, e como meu ambiente familiar sempre foi muito aberto a variedade religiosa, não tive nenhum problema quando de minhas excursões religiosas no geral. Mas conheci (e conheço) pessoas que viviam escondendo os altares, em batalhas sem fim com as famílias, exorcizados, humilhados... Só que essa é outra prosa.

Enfim, falávamos,os camaradas e eu sobre a questão de mães e filhos. De como esta relação é sagrada e forte, acima das eventuais situações que a vida pode trazer. Afinal, mãe é mãe. Os mitos de Aset e Heru-sa-Aset mostram bem isso, de tudo que ela faz por ele, os sacrifícios que ela enfrenta por seu filho amado. Aset é uma mãe com verdadeiro amor e dedicação, e mesmo quando Heru-sa-Aset em meio a um acesso de raiva decepa sua cabeça, a relação deles não é abalada.
Por outro lado, Ra proíbe Nut de ter filhos em outro mito. Ela sofre muito por conta de sua decisão, afinal já está grávida e não pode dar a luz. Suas dores e tristeza são indescritíveis, mas no final Djehuty dá um jeito e os filhos nascem. Com Hethert, Ra também se prevalece de sua autoridade e a proíbe de envolver-se com Heru-wer - o que acarreta sua fuga e traz coisas ruins para Kemet como consequencia
Ninguém pensa que o amor de Ra por sua filhas é questionável, mesmo com suas atitudes. Todos entendem que ele talvez errou ou que tudo eram ações de um plano maior. Na vida, como no mito, se um pai tem esse tipo de atitude com suas filhas ele está sendo zeloso ou tirano, mas cumprindo um papel de proteção.
Porém, atitudes desta natureza de uma mãe são inaceitáveis tanto cultural quanto socialmente. Ou ainda, se um filho não se dá bem com sua mãe, é quase um crime capital.

Quem disse?!

Nem todas as mães amam seus filhos, nem todas os querem ou se importam com eles. Nem toda mulher que é mãe queria se-lo ou então se arrependeu de ter sido. Nem todas tem paciência, ou amor incondicional não. Isso é muito mais comum do que se pensa. Aí quando uma dessas mulheres faz algo de ruim para seu filho, é um escândalo duplo - por ela, uma "mãe desnaturada" e pelo filho. Afinal, como uma mãe pode agir assim? Como ela não vai ser gentil, amorosa e dedicada a  uma vida que ela ajudou a gerar?

Simples: não sendo. 

É preciso lembrar que está se falando de relações interpessoais com pessoas não escolhidas por vontade própria. Elas acontecem e como qualquer outra relação, tem um percentual de dar certo ou não. N Fatores contribuem para que a coisa flua ou role ladeira abaixo. Um tanto outro par de vezes as pessoas não percebem o que está acontecendo e mergulham num ciclo de culpa e raiva destrutivos. 
Amor a prova de balas não existe, é utópico. As relações são todas perigosas. 

Como reconstrucionista, não posso me furtar a repensar realidades. Então, se alguém tem um tipo de relação com sua mãe ou com seu filho fora do padrão esperado, não tenho que acusar ou julgar. Se alguém não mantém uma relação harmoniosa com sua mãe, ou despreza seu filho, essa pessoa tem que também ter a legitimidade de expressar sua religiosidade sem terrorismos ou intervenções para salvar relacionamento. 
Como kemética, entendo que preciso de compreensão para entender como se processa essa realidade diferenciada e avaliar se as atitudes desta relação não são isfet. Para isso, muita conversa, leitura e contato com os Netjeru não para consertar nada, mas para tentar ajudar a pessoa em sua jornada.  




27 de jan. de 2013

Horrores

O mundo inteiro - literalmente - acordou com a horrível notícia do incêndio em Santa Maria. Mortes horrendas, mais de 200 pessoas que estavam em uma casa noturna. Eles faziam aquilo que a gurizada faz em noite de sábado, sair pra curtir a balada.

Se algum deles era pecador, fornicador, ímpio, invocador de espíritos, seguidor do diabo, tinha karma de outra vida ou qualquer bestagem fatalista? Desconheço, assim como a grande maioria das pessoas que estão a falar sobre isso no dia de hoje e nos dias que seguirão.

"Todos eles estavam em isfet?". Não. Em isfet, os donos do local ao negligenciar a segurança, ao fazer pouco caso das providências que devem ser tomadas para garantir que em caso de emergência o dano seja o  menor possível. Em isfet, a pessoa que usou um rojão ou o que foi durante o show sem se informar se isso era permitido e seguro. Em isfet, o segurança que dificultou o acesso à saída das pessoas. 

Notem que isfet está em momentos e atos cometidos, não em uma dimensão fixa permanente. Não nascemos em isfet, provocamos isfet - e assim como essas pessoas, nas situações que eu apontei cometeram isfet, elas também trouxeram ma'at. Não, não quero eximir responsabilidades, apenas estou mostrando um pouco do outro lado também.

É claro que um bom ato não significa necessariamente que se corrigiu um ato mau pois tudo é diferente. Nossos atos em isfet são tão lembrados como nossos atos em ma'at no dia do Julgamento.Entretanto, os responsáveis por toda essa noite de horror, não terão seus kau refrescados e puros. Seus corações estarão pesados por terem ido contra várias das purificações de Ma'at. A reparação será feita, neste ou em qualquer outro mundo.

Não, não é justo e certo que tantos tenham partido para o Oeste assim tão cedo e de um jeito tão horrendo.Mas deus algum, deste ou de outro panteão tem algo a ver com isso. 
Por essa razão, meus sentimentos e preces para que a jornada ao Duat dos que partiram seja tranquila. Que Yinepu e Nebthet os conduzam e guardem.Um milhão de vezes eles tenham seus kau refrescados durante a jornada.
Que Sekhmet e Djehuty estejam atentos aos profissionais da saúde que estão trabalhando para cuidar dos feridos.
E que Ma'at cure as feridas e a dor das famílias que perderam seus queridos.Que seus kau possam ser refrescados e seus ib sejam confortados, hoje e sempre.

19 de jan. de 2013

Django, com d mudo

Fui assistir a Django Livre mais cedo. Sou fã do Tarantino há algum tempo - ainda lembro da sensação de choque e espanto depois de assistir Pulp Fiction, lá numa tarde perdida dos anos 90. Acabei gostando muito do estilo dele, uma coisa diferente (e com muito sangue) e procurei sempre acompanhar os seus filmes. Ah blablabla de críticos e pessoas especializadas no assunto a parte que todo mundo já sabe e eu também concordo, tem algo a mais que me faz gostar do Tarantino.

O que eu gosto nele mesmo é a capacidade que ele possui de criar mitologias completas (e vou voltar neste assunto outra hora). 

Kill Bill, por exemplo, é a saga de uma mulher que está longe de ser modelo de bondade, mas sim uma assassina que tenta mudar sua vida por conta de uma gravidez inesperada. Bom, ela sofre um revés na sua tentativa de viver uma vida feijão com arroz (eu antigo bando tenta matá-la), acaba em coma, sobrevive e aí sai em busca da reparação.  No processo ela se encontra com um mestre de armas, relembra lições de um antigo mentor num momento de vida e morte, enfrenta e mata seus adversários e por fim, sai para viver o resto de sua vida com sua filha. 

Mas em Django Livre, é diferente. Django é um Siegfried negão, autêntico e de bom coração.Ele sai da vida sem perspectiva e horrenda. Um mentor o treina, instrui e lhe mostra possibilidades. Django se permite experimentar e ir além, fazer o que for preciso, ser o que mais lhe é odioso em nome de seu objetivo.  Ele aposta, perde, mas ressurge ainda mais poderoso e cumpre o que se propôs. Tudo isso sendo ele mesmo!

Impossível não pensar em tudo que já li por aí sobre os deuses, heróis e suas jornadas épicas. Impossível não ver um pouco de Aset na Noiva de Kill Bill, um toque de Set no Django, ou Djehuty como o Dr. King Schultz. A lista de relações é imensa se for parar para pensar. 

Eu já tenho um tempo de HoN, e mais um tempo de "vida pagã". Nesse percurso, (vi) vejo de tudo um pouco. Tem os que piram e veem os deuses em tudo o tempo todo, tipo o povo que vê Jesus numa torrada. Tem também os que desenvolvem uma intimidade do tipo que leva Bast para a pet shop, praticamente. Outros, porém, parecem ficar numa eterna prisão de pesquisa - onde muitos, muitos se frustram pela falta de contato espiritual.

Uma das coisas que eu sempre falo, quando as pessoas começam o curso de iniciantes é para as pessoas conhecerem e se deixar conhecer. Manter a mente aberta. Aí passa algum tempo e muitos falam que não conseguem compreender um aspecto ou o papel  de um Netjeru. Outros reclamam que se sentem desconectados, que tudo é muito distante. Abrir a mente é para isso, para ajudar no contato, enriquecer a vivência, favorecer a parte prática - quando? Sempre, até no filme do Tarantino.  


12 de dez. de 2012

30 dias de paganismo - Dia 04: Datas sagradas


    Toda religião tem seus esquemas de datas, seus cronogramas. Com a Ortodoxia Kemética não seria diferente.

    Como somos reconstrucionistas, utilizamos um calendário recompilado de acordo com todas as fontes históricas disponíveis. Assim, não privilegiamos os festivais de uma cidade em detrimento da outra, até porque não haveria lógica alguma nisso. Afinal, a era em que vivemos agora não tem mais o Egito dividido em nomos e cidades estado com divindades diferentes. 

    Nosso calendário anual segue o rumo das estações do Antigo Egito, regidas pelos movimentos do Nilo através do ano. Assim, temos 12 meses de 30 dias. Cada mês é regido por uma divindade e dentro dos 30 dias encontramos festivais dos mais diversos não só para a divindade do mês, mas para todas. Os festivais variam em duração, podendo ter entre 1 e 10 dias. Sim, é festa!

    No mês, celebramos especialmente o 1º, 6º, 15º e 30º dias. Ou seja, o início, a metade e o fim do mês. Cada dia deste tem uma diferente atribuição e tarefas a serem realizadas. No 6º dia reverenciamos os ancestrais. Comemoramos a Lua cheia no dia em que inicia também. 

    Temos, durante o ano, grandes festivais. O Ano-novo é nossa maior celebração. Também temos Opet celebrando a realeza, Wag que celebra os ancestrais, Aset Luminosa, a Bonita Festa do Vale para Hethert, Heb Sed com a elevação do pilar Djed para Wesir... Meus preferidos? O ano novo,sem dúvida. Em segundo lugar, Aset Luminosa, é lindo!

    Leva um tempo para se ajustar ao calendário KO, eu mesma penei no início para me adequar. O início do ano kemético não bate com o gregoriano, por exemplo. Aí chega na época do ano novo gregoriano, como faz?Faz outra festa, ora! Uma coisa não exclui a outra, a não ser que a pessoa não curta festas, claro. 

    A vida de um kemético é assim, repleta mesmo. O zepi tepi – início – é diário. Mas não é nada impossível de se administrar, mesmo com compromissos “mundanos” ou de outras fés.

22 de abr. de 2012

Eu não destruí meu coração

Em hotep!
Gosto de compartilhar, especialmente aquilo que é interessante.
Aí, por uma feliz casualidade do destino, a autora deste texto o enviou para meu e-mail. Conversamos a respeito e pedi para para publicar aqui, no que ela concordou (o que me deixou muito feliz e agradecida). Seu blog, se alguém quiser visitar, o http://garota.delicada.zip.net/,  é um misto de diário mágico e escritos pessoais. Enjoy! 



"Eu Não Destruí Meu Coração"

"Eu não destruí meu coração.
Eu não fiz o mal."


     No Antigo Egito, após sua morte, uma pessoa deveria declamar as 42 Confissões Negativas de Ma'at antes que seu coração fosse posto em uma balança, para ter seu peso comparado com a Pena da Verdade de Ma'at. Caso suas palavras fossem vãs, o morto teria sua alma devorada e devolvida ao estado inicial de caos. Porém, caso seu coração fosse leve e suas palavras, honestas, a pessoa em questão desfrutaria de descanso e paz antes de retornar ao mundo dos vivos. Embora constituídas por muitos princípios compreensíveis - como não roubar, não matar, não cometer adultério e não mentir - há, porém, alguns que requerem grande interpretação e tempo para poderem ser assimilados. De qualquer forma, meu intuito hoje não é falar diretamento do aspecto histórico ou mesmo religioso das Confissões, mas, sim, de sua vivência. Viver em Ma'at não é diretamente um conceito pagão. É uma questão ética. Não se trata se seguir dogmas ou preceitos extremos, mas, sim, de viver em harmonia com o mundo, com os deuses (todos eles, sejam os egípcios, nórdicos, gregos, indianos, africanos e até mesmo o Senhor dos cristãos) e consigo mesma.
           Ao meu ver, as 42 Confissões podem se resumir em:

"Eu não destruí meu coração.
Eu não fiz o mal."

          São palavras simples, mas um significado gigantesco.
         Não há nada pior do que a maldade - falta de amor. As pessoas más sentem medo do amor. Não pode haver outra explicação. Nos dias atuais a falta de amor pode ser vista como uma epidemia. E não me refiro à falta de amor romântico, mas sim, à falta do amor incondicional. O amor entre os iguais e diferentes, o amor dentro de uma família, o amor próprio.
         O amor não se traduz em palavras. Ele é a soma de ações. O amor requer lutas e tempo. Porém, o amor é mais do que batalhas. É alegria, confiança plena e acima de tudo, respeito. O respeito é a base de toda relação, seja ela social, amorosa ou familiar. Infelizmente, precisamos lidar com pessoas que desconhecem o sentido dessa palavra. A arrogância, a ignorância e a falta de educação situam-se como as principais formas de desrespeito. Antes, eu costumava me magoar com extrema facilidade e muitas vezes, sentia revolta em meu coração. Quando passei a realmente refletir sobre as situações, percebi que não vale a pena. Não devemos destruir nossos corações com revolta por pessoas fracas - a ignorância é a máscara da fraqueza - ou mesmo gastar nossas energias lutando batalhas perdidas. Obviamente, isso não quer dizer que devemos nos fechar para o mundo. Estarmos aqui, firmes, prontas para devolver rosas aos que nos apedrejaram e abraçar os que nos deram as costas, faz toda a diferença. Na nossa vida e na vida dessas pessoas. Talvez demore. Talvez não aconteça. Mas, no final, o que realmente vale é saber que o certo foi feito.
            A vida é feita de infinitos obstáculos. Lidamos com pedras diariamente. Embora o chão seja seco, devemos espalhar sempre as sementes da bondade. Com sorte, ao lado de alguma pedra, uma árvore poderá brotar.

6 de fev. de 2012

Flagrantes da vida real

Esta é a reprodução de uma mensagem que enviei a amigos que se desentenderam. Algumas partes foram editadas pois a intenção não era expor ninguém, só compartilhar com vocês um pouco do que eu penso e da maneira que, como kemética ortodoxa, estou tentando lidar com conflitos.

"Em hotep!
Depois de uma noite com pouco sono e muitas reflexões, vim falar com vocês sobre o ocorrido de ontem.

Inicialmente, alguns esclarecimentos:
Não estou tomando partido de ninguém e vamos deixar isso bem claro. Aqui todos são crescidinhos e não vou aturar nenhum tipo de alegação deste teor.
Também não vai rolar nenhuma cruzada do tipo "fulano e ciclano apoiam X contra beltrano que apoia Y".Ninguém está no grupo para essas bestagens. Sinceramente eu conto com o bom senso dos dois para nem começarem com algo do gênero também.

Tudo claro, prossigo:
Não tem propósito manter uma discussão infrutífera salva.
Não interessa quem começou e mimimi. O *** não é lugar de troca de ofensas e gritarias. Bons modos não são opcionais, educação, tampouco.
Querem brigar? É entre vocês: nem eu, ou ninguém que esteja lá tem algo a ver. Não querem mais se falar, querem se banhar no sangue um do outro ou o que valha - coisa de vocês. Nenhum de nós tem que ser atingido por conta disso.

Vocês dois já vinham num clima de tensão crescente nos últimos tempos mas nunca enfrentaram a situação de frente e ficaram vivendo de altos e baixos com sarcasmo ocasional de ambas as partes - e ninguém tomou nenhuma atitude quer para apaziguar ou detonar de vez.
Agora, agressão gratuita, em público?Isso é além de qualquer limite. Lá não é para isso. Vocês desrespeitaram mais que um ao outro, desrespeitaram todo mundo.

Nossa vida, como keméticos ortodoxos é lutar todos os dias para permanecer mais em Ma'at do que em isfet.
 
X, tu te atirou direto em isfet ao violar, só ontem, 3 das purificações: causou dor em outro (10), agiu com insolencia (26) e falou demais (31).Isto, somado ao desrespeito com todos os outros membros não é, nunca foi e nunca será aceitável.

Tu foi convidado a se retirar.
A partir de agora, aproveite esse tempo e vá pensar nas tuas atitudes, nas reais motivações dos teus atos dentro da comunidade kemética. Vá estudar e praticar a fé, pedir orientação aos deuses para clarear tua mente,  organizar o lugar da fé kemética e tudo que ela traz na tua vida - isso inclui estar em comunidade (mesmo que virtualmente), respeitar a si mesmo e aos outros, compreender que as pessoas tem o seu espaço e não tem a obrigação de aturar tudo. Ser kemético ortodoxo é também se doar e não só retirar. Exercitar o senso crítico, buscar por si e não esperar "o maná do céu". 
 
Y, já está fora. Pense o que quiser, só com clareza e equilíbrio de palavras e ações - o justo jamais deve pagar pelo injusto. Tua atitude foi uma reação, ok, mas ela foi além dos limites. Também é isfet devorarmos nosso próprio coração ao permitirmos que ele se encha de isfet (coisas nocivas, rancores e mentiras), já diz a purificação13.

E errei eu também, pois sinceramente pensei que vocês dois tinham só uma birra e não algo mais profundo. Pensei que vocês se toleravam e até, pasmem, se gostavam em algum nível - por mais raso que fosse. Eu deixei as coisas passarem sem tomar alguma atitude por conta do meu "otimismo". Isfet pra mim também, já que me esqueci da purificação 24 que fala para não trair o caminho pessoal de cada um.

Senebty."

Falarei sobre as purificações ainda por aqui, aguardem. :)

23 de dez. de 2011

Natal: aniversário de Heru-sa-aset?

Hotep!
Tenho visto por esses dias que antecedem o natal uma enxurrada de fotos e posts no facebook e na internet do tipo:

Geralmente, as fotos vem acompanhada de um texto como:

"Hórus nasceu no dia 25 de Dezembro da virgem Ísis (ou Meri na terra) acompanhado da estrela Sírius ao leste. Aos 12 anos, muitos o consideravam uma criança prodígio, com seus poderes.
Aos 30, Hórus foi batizado por Anup. Então, se reveleu o Messias dizendo ser o príncipe da eternidade e escolheu 12 discíoulos. Viajou pelo mundo com seus 12 discípulos praticando milagres como curar duanças e enfermos e ressucitar mortos, sendo o mais destacado um homem chamado El-Azar-Us. Hórus andou sobre as águas, enquanto alguns de seus discípulos o olhavam de um barco e tinham medo de ir até lá. Hórus disse que eles tem falta de fé. Em reuniões com seus discípulos, Hórus disse que é o caminho, a verdade e a vida. Mais tarde, Hórus foi invejado pelos governadores por o considerarem "o rei dos egípcios", então ele foi crucificado e morto. 3 dias depois, ele ressucitou."


Certo? Hmmm... deixa eu ver:

Hórus nasceu no dia 25 de Dezembro da virgem Ísis (ou Meri na terra)
Inicialmente, Heru-sa-aset (Hórus) é o filho de Aset (Ísis) e Wesir (Osíris), que eram casados. A concepção de Heru-sa-aset ocorreu de maneira não convencional, digamos: Aset, foi fecundada por Wesir enquanto realizava ritos para tentar trazê-lo de volta à vida. Assim, primeiro ponto: se Aset era casada, logo ela não era virgem. Segundo: Heru-sa-Aset tem um pai, Wesir.

acompanhado da estrela Sírius ao leste.
O apogeu da estrela sirius acontece na época mais quente no ano no Egito - localizado no hemisfério norte - e marca o início do novo ano.Se, de acordo com o texto, Heru-sa-aset nasceu acompanhado da estrela sirius, isto jamais poderia ocorrer em dezembro, que é um mês frio.

Aos 12 anos, muitos o consideravam uma criança prodígio, com seus poderes
Heru-sa-aset é um deus. É completamente óbvio que este tenha poderes, a despeito da idade que possua.

Aos 30, Hórus foi batizado por Anup.

Não existe nenhum registro de batismo de Heru em nenhuma referência bibliográfica ou histórica. O mais próximo de batismo que existiu seria ou a cerimônia de coroação dos reis ou a nomeação de alguém ao nascer/assumir algum compromisso. 
Outro ponto: Anup, no máximo, pode ser um nome alternativo para Yinepu (Anúbis). Apesar de Yinepu ter vários papéis e atuar em esferas diversas, batizar pessoas/deuses nunca foi descrito como uma de suas atribuições.

Então, se reveleu o Messias dizendo ser o príncipe da eternidade e escolheu 12 discíoulos. 

Duas coisas: o rei da eternidade (e não príncipe) é Wesir, soberano do Duat.
E, nada foi documentado, quer pelas versões gregas, quer pelos egípcios acerca de Heru-sa-aset ter 12 discípulos.

Viajou pelo mundo com seus 12 discípulos praticando milagres (...) 
Hórus disse que é o caminho, a verdade e a vida.

Heru-sa-aset realmente viajou muito, quando criança, escondendo-se de Set... Sobre ele estar com os discípulos, ter andado sobre as águas e ter afirmado a frase acima, também nada consta em nenhuma referência.

Hórus foi invejado pelos governadores por o considerarem "o rei dos egípcios", então ele foi crucificado e morto.

Heru-sa-aset teve um grande adversário: Set. A disputa aconteceu por causa do direito ao reinado no Egito. Ambos se enfrentaram por vários momentos e utilizando táticas diversas, mas em nenhum registro consta que Heru-sa-aset tenha sido crucificado - até porque isso era usado pelos romanos (e estamos falando aqui de egípcios).

3 dias depois, ele ressucitou.
Quem morreu e ressuscitou foi Wesir - e somente ele.

Conclusão: mais uma vez as pessoas fazem afirmações baseadas em idéias sem sentido ou comprovação e tomam como verdades absolutas. E o pior: esculhambam a religião/mitologia alheia!

Por favor, informem-se antes de sair por aí bancando a Ofélia,
                                                                          que "só abre a boca quando tem certeza".

Senebty!

20 de dez. de 2011

Rapidinhas

Hotep!
Quando recebo perguntas no formspring, automaticamente compartilho as respostas aqui, já que a dúvida de um pode ser a de outro também, ok?

Estamos no facebook também: Ortodoxia Kemética Brasil

Senebty!

20 de ago. de 2011

Quanto vale?

Estava perambulando pela web e  me deparei no site de um praticante de magia. Lá, ele com sinceridade postou os valores dos seus serviços. Rituais - feitiços na verdade -  para deuses/energias predominantemente romanos/gregos saíam na faixa de R$300 a R$1.000,00. 
Porém, o que realmente me deixou, digamos, admirada foi o preço para participar de um ritual sazonal: R$1.000,00.

Sim, isto mesmo - a participação em um rito sazonal custava R$ 1.000,00. Mil reais!

Não tenho nada contra, em absoluto, as pessoas cobrarem por serviços prestados. Magia é troca, e a pessoa se dispôs a fazer algo e dedicar-se, ok, paga-se por isso. Vivemos no capitalismo.
O que me deixa estupefata é a exorbitância, a falta de senso nos preços. E isso é meio geral, eu noto.

Ordens esotéricas cobram pequenas fortunas para filiação. Sacerdotes/isas praticamente fazem pequenos assaltos por uma iniciação.Ocultistas pedem quantias vultosas para um feitiço.
Qual o critério: O grau de complexidade do procedimento? O grau de fodassidade de quem executa? De tudo um pouco? Só massagem no ego?

Enfim... só para constar, o curso de iniciantes da House of Netjer é gratuito. O trabalho dos sacerdotes e outros shemsu que como eu, executam a função de atuarem como intermediários e tradutores também não tem nenhum custo financeiro para quem os desfruta.
Eu não penso ser superior ou inferior por isso - apenas faço meu trabalho e me dedico à minha fé. Não me lamento por não virem alguns zeros a mais na minha conta bancária por isso. Sirvo aos deuses atuando pela comunidade kemética ortodoxa, e essa satisfação junto com a certeza de que sou eu que estou fazendo um trabalho certo, autorizado e reconhecido pela líder da minha religião me satisfazem de uma maneira única.

Respondendo à pergunta do título, bom, meu ka está alimentado. Penso que isso já valha o suficiente. E você, o que tem feito para alimentar seu ka estando emanado em Ma'at?

10 de ago. de 2011

Linguística

Em Hotep!

Ano de Ptah,logo, falar em construção é até pleonasmo.
Venho produzindo/traduzindo boa parte do que tem por aí sobre a religião que sigo em língua portuguesa. Quando comecei, há alguns anos, além da significância per se das palavras, a questão da estilística sempre esteve (e está) presente. 
Fiz algumas opções, e, dentre elas, o termo "Kemetismo Ortodoxo". 
O que ocorre é que, embora não esteja errado, o termo não está alinhado com o nome Kemetic Orthodoxy, que além de nomear a religião, é também a sua denominação legal.

Assim sendo:

Eu, Tanakhtsenu, sat Khepera her Set, mery Aset her Heru-wer, shemsu, criadora e tradutora de todos os textos e versões em português sobre a religião kemética ortodoxa deste blog, do site, twitter, canal do youtube, formspring, facebook,multiply e outras fontes de difusão digitais ou não, ainda que não citadas diretamente, declaro que:
a partir desta data, I Akhet 8, mês de Djehuty, ano 19 do reinado de Hekatawy I, regido por Ptah - 10 de agosto de 2011 - o termo Ortodoxia Kemética  é o termo correto a ser utilizado em substituição ao termo Kemetismo Ortodoxo quer por mim e por qualquer outra pessoa, membro da House of Netjer ou não, ao referir-se à religião cujo nome em inglês é "Kemetic Orthodoxy".

A autoridade que possuo para tal decisão é imputada por anos de estudo,dedicação e práticas à religião kemética ortodoxa e endossada por anos de prática profissional e estudos dedicados ao idioma inglês.
Caso alguém deseje, me disponho a mostrar as evidências semânticas e etimológicas que me levaram a adotar a mudança de termos.

Senebty,
Tanakhtsenu.

8 de ago. de 2011

Wep Ronpet Nofret

Feliz ano novo!
Estamos hoje no sexto dia do ano 19, ano de Ptah. o//

Quero dizer que orgulhosamente celebramos, pela primeira vez, o Wep Ronpet Brasil - este ano no ES. Presentes eu, HapDjehuty, PautKhepera e PaqeniSekhmet, num encontro de muito sol e momentos inesquecíveis. 

O Wep Ronpet é o maior feriado do Kemetismo Ortodoxo - para as celebrações serem completas, iniciamos no último dia do ano, passamos mais 5 dias com devoções diárias e celebramos o dia do ano novo propriamente dito ao nascer do sol. Quem quiser ver um pouco de como foi, visite (e curta) a página do Kemetismo Ortodoxo no Facebook aqui.

Vou falar um pouco sobre o que rolou - e "por um pouco", esperem um post gigante.
Convido aos outros participantes para deixarem aqui suas impressões também. :)

Chegada
Nos reunimos todos no último dia do ano 18, quando eu e Hap nos dirigimos para o ES. Tinha dormido pouquíssimo, mas nem por isso meu entusiasmo diminuiu - pelo contrário! Encontro divertido e com muitas risadas.
Eu cheguei pela manhã, então deu tempo de ir para a casa dos anfitriões, descansar um pouco, almoçar e voltarmos para buscar Hap. Mais um encontro divertido e cheio de risadas.
Mais tarde, todos juntos, esquematizamos como seria o próximo dia e como faríamos os rituais dos outros dias. Optamos em revezar quem conduziria os ritos,estando a condução ligada à linhagem do oficiante.

Dias epagomenais
No dia seguinte saímos de manhã para passear e fazer as compras do que necessitávamos em um bairro local especializado - a Vila Rubim . Encontramos o que queríamos, fizemos alguns ajustes.À noite montamos o altar, fizemos a devoção para Wesir, nosso rito sagrado e o rito aos Akhu. Foi uma grande emoção para todos, pela primeira vez reunidos em um ritual coletivo.

No outro dia, fizemos a devoção para Heru-wer no altar do dia anterior. Fizemos oferendas e preces e acabamos esticando a comemoração à noite também.

No 3º dia, a devoção para Set.Como não poderia deixar de ser, sendo seu aniversário, Ele nos presenteou - situações inusitadas, pequenas confusões e muitas risadas.Sua devoção foi diferente, fora do altar, mas com certeza foi uma das mais marcantes.

4º dia, devoção para Aset. Mudamos para o altar principal. Todos nós adornados para honrar a Grande Senhora de Kemet, em um momento de grande intensidade.Não houve rito mais lindo e cerimonioso do que esse.

Por último, no 5º dia, a devoção a Nebhet. O dia amanheceu estranho e passamos o dia parados, todos com a mesma sensação de tempo arrastado. Sua devoção também foi no altar principal, à noite.

Deixamos as coisas meio preparadas para o dia seguinte e os outros foram dormir. Eu ainda fiquei acordada até mais tarde fazendo os últimos retoques e fui deitar.

Wep Ronpet
Cedo, muito antes do sol nascer, levantamos.
Um a um, fomos nos preparar. O incriado, ainda no mundo, fez sua presença ser notada através de incidentes diversos que acabaram nos atrasando alguns momentos. Driblamos todas as adversidades e iniciamos os ritos, com convicção.
Fizemos a devoção do dia, o dia mais sagrado, pedindo as bênçãos para este novo ano.
Reunimo-mos e destruímos o incriado, o que se alimenta em isfet. Toda nossa força posta em ação para destruir e afastar. Pelo Olho de Ra e sua chama, derrotamos.
Saímos em procissão, buscando a primeira luz.Banhamo-nos em dourado, nossos deuses e deusas renascendo em ouro. Cantamos e nos alegramos.
Votamos para o altar principal. Iniciamos o rito sagrado, agradecendo por mais este ano, o ano 19, regido por Ptah. Foi um momento de pura intensidade, em que a emoção calou as palavras. Pedimos e agradecemos, compartilhamos e recebemos. Um festa, onde todos pudemos sentir as presenças dos deuses e deusas.
O tempo voou e quando nos apercebemos, 3 horas tinham transcorrido. Famintos e felizes, partilhamos o café da manhã. 
Só então o corpo sentiu e fui descansar. Mais tarde, saímos e fomos aproveitar o dia de festa e sol. A noite chegou, mais um jantar de celebração. Depois, arrumar as malas.

Partida
Correria pela manhã, últimas arrumações. Acompanhamos Hap até a condução que o levaria ao aeroporto e nos despedimos.
Almoçamos, últimas arrumações e a luta para fechar a mala.Saímos para o aeroporto e, como tínhamos tempo, tomamos um café. Chamada do voo, e tchau, ES.

Impressões
Difícil é conceituar o que significa estar entre aqueles que partilham o meu caminho, emanados em Ma'at. 
Há muito tempo se idealizou e planejou algo assim, mas as circunstâncias e as pessoas com atos idiotas e mesquinhos impossibilitaram de acontecer antes. Antes deste encontro só tive uma alegria similar a esta, que foi na tarde em que depois de muitos anos ganhei o abraço e o sorriso da Siath.

O Kemetismo Ortodoxo não é e nunca foi, uma religião de internet ou um lugar para se ganhar nome legal ou ainda o lugar para os colecionadores de títulos de ordens.

Vou repetir, porque eu já pensava isso, e agora, meu pensamento e opinião estão mais fortes ainda:

O Kemetismo Ortodoxo não é e nunca foi, uma religião de internet ou um lugar para se ganhar nome legal ou ainda o lugar para os colecionadores de títulos de ordens. 

Aqui a comunidade é importante SIM, vivenciar a fé com os outros é importante SIM, praticar que se aprende é importante SIM, trocar experiências é importante SIM, respeitar os outros é importante SIM, ter boa educação é importante SIM.

Tudo isso eu já pensava e sabia, mas agora, depois dessa experiência, de estar entre os meus no tempo mais sagrado... Como eu disse, meu pensamento e opinião estão mais fortes.
O tanto que eu ganhei nesses dias eu não aprendi em anos de leitura de internet. Aprendo sim, me dedicando e pesquisando, mas a interação com outros... Só vivenciando para se ter noção.   

Vivam. :)

Esse ano, o ano 19, é o ano de Ptah, Ele que é o grande construtor. Dua Ptah, acompanha-me durante este ano e permita que minha construção seja poderosa e durável. Kheperu! Nekhtet!

31 de mar. de 2011

Um momento

A ti, que de curiosa, passaste a conhecida, de conhecida para interessada, de interessada para companheira, de companheira para amiga, meu mais sincero Nekhtet neste novo dia, teu zepi tepi, que se inicia. 

A ti congratulo e saúdo, saída do templo e banhada pelo alento do sol. Tu, que carregas o sol da manhã no teu nome e tem dentro de ti segredo, magia e uma força vermelha. Hoje não dou as mãos para te ajudar, mas para que caminhes ao meu lado em nossa terra de areias. 

Ainda ontem recebemos visitas em nosso lugar sagrado, e muito me fez feliz estar lá e ver que ela, a nossa sacerdotisa também desfrutou da alegria das visitas. Sim, elas eram alegres, curiosas e também tímidas. Suas vestes e os sussurros, os olhares e os sorrisos, nada deixou de ser notado. Em certos momentos a tarefa foi árdua, pois não era eu somente aquela que redesenhava palavras, mas também a que zelava e participava da tua cerimônia.

Haviam tantos dos nossos! E foi com orgulho que te vi ir à frente, nervosa, mas em frente. Recebeste teu presente e teus olhos estavam repletos de lágrimas e felicidade. Gratidão e amor eu vi neles, e como teu Pai, que também é meu, brilhaste.

Juramentos e promessas proferidos, ainda atônita estavas quando todos começamos a celebrar. E então eu fui comemorar também após cumprir meu dever. Não pude dar atenção a um dos nossos, pois este, tal qual seu pai, veio e partiu silencioso. Tudo muda de novo e quando tentei brindar a ti, fui chamada ao dever por outro dos nossos. 

Não estavas só, as convidadas te faziam companhia, e assim parti por um breve instante. Por fim, cheguei a tua celebração, te saudei e brindei. A mim vieste com palavras de gratidão e carinho, que meu coração e alma bem receberam. De meu Pai, aquele que não é o teu mas tens grande apreço, recebi cumprimentos que te mandei.

Conversamos e celebramos e o tempo se acelerou. Era hora de todos irmos, mas com a promessa de nos reunirmos em outras comemorações. Parti para minha morada, rumo a meu descanso, cansada e feliz.

Tua jornada certamente não chegou ao fim, mas agora deixo eu de ser tua "tia" para com orgulho te dar aos mãos e te chamar de irmã. Bem-vinda à família. 

26 de mar. de 2011

30 dias de paganismo - Dia 03: Ortodoxia x gnose pessoal

           Logo de cara, uma das primeiras palavras a ressaltar aos olhos é o “Ortodoxo” quando lemos Ortodoxia Kemética. Então, o que isso quer dizer, que sigo por aí, de cabeça raspada como uma sacerdotisa dos afrescos e já estou eu, Tanakht, construindo minha tumba para quando eu morrer?
            Calma que não é bem assim. Primeiro que eu curto o meu cabelo onde e do jeito que ele está, então a parte de raspar a cabeça fica para outra ocasião. Quanto à tumba, primeiro penso em construir outras coisas primeiro, a tumba, quem sabe depois, ok?
            Quando eu falo em ortodoxia, me refiro à parte em que nós, keméticos, procuramos seguir aquilo que define uma religião como reconstrucionista: tentar chegar o mais perto do possível do que os antigos faziam, mas de acordo com o nosso tempo. Por exemplo, eu não acendo uma vela com sílex, eu uso fósforo mesmo. Isso é ser racional, e não um fanático. A questão toda que pega, e que muita gente não compreende é esta: é preciso disciplina sim, mas com bom senso, sem tolher a expressão de cada pessoa.
            Da mesma forma, não é aceitável flertar com o samba do crioulo doido. Exemplifico:
Se está dito que a pessoa tem que ter um altar, ela tem que ter um altar.Arranje espaço! Não tem um cômodo separado, faz no seu quarto; não pode ser visto, bota numa gaveta ou numa caixa e na hora que for usar, acende a vela do lado de fora. Ninguém precisa construir algo como Abu Simbel se não pode. Faça o que pode, mas faça o seu altar.
            Sem samba do crioulo doido: nada de não fazer altar porque “não sentiu necessidade”, “porque honra os deuses no astral”. “porque distribuir pela casa fica mais bonito”. Ortodoxia: os antigos tinham templos incríveis que nos maravilham até hoje, e mesmo os mais humildes tinham altares em suas casas. Então, sem choro nem vela. Disse e repito: não é um caminho para todos.
            E onde entra então, a gnose pessoal nisso tudo? Keméticos são nerds robôs?
        Bom, talvez alguns de nós sejam nerds, ainda não fiquei sabendo que tenham robôs keméticos...Mas na maioria, exercitamos nosso direito sagrado de nos expressarmos. Sei de pessoas que honram seus deuses dançando, outras dedicam seus estudos universitários; alguns escrevem hinos, outros pintam. Outros apenas contemplam a natureza e assim se conectam. Outros, como eu, falam sobre suas crenças.
            Alguns keméticos usam velas pequenas, outros das de 7 dias, outros usam lamparinas. Alguns chamam seus Pais por apelidos, outros usam os nomes completos com os epítetos. Sei de pessoas que compram presentes para ofertar a seus deuses, como bichos de pelúcia, jóias, brinquedos.Alguns cobrem seus altares de seda pintada a mão, outros usam toalhas de mesa.
      Eu poderia ficar aqui escrevendo até meus dedos e olhos caírem. A diversidade é fascinante e uma celebração que muito me agrada. Gnose pessoal na ortodoxia é isso, o toque de diversidade na unicidade que permite que ela não destoe, ainda que seja diferente. Todos pilares estão lá, firmes e uniformes, mas multicoloridos.

P.S.: Um dua especial ao meu Pai Set, em seu dia, e que foi minha inspiração para esse texto. Dua Set!

20 de mar. de 2011

30 dias de paganismo - Dia 02:Divindades

    Sou reconstrucionista, logo, não criei um panteão ou uma mescla de panteões. O panteão egípcio é o que sigo, e este é composto por vários deuses e deusas.
    Os deuses/as egípcios tem características diversas, mas geralmente encontramos suas descrições e imagens de maneira zoomórfica, ou seja, com partes de animais.Por exemplo:


Sobek é um homem com cabeça de crocodilo.









                    

                     Renenutet é uma mulher com corpo/cabeça de serpente. 

    Correlacionamos também os deuses aos animais presentes em suas representações. Assim, o mesmo Sobek pode aparecer representado como um crocodilo ou Renenutet como uma serpente.O culto aos animais sempre esteve presente no Egito, com os falcões e besouros sendo os primeiros animais a serem considerados sagrados.
    Os deuses tem conexão com a natureza como um todo e seus fenômenos. Por esse motivo, considera-se que a religião seja panteísta - os deuses estão em tudo. Os deuses também possuem ligações com o céu em seus diferentes momentos através do dia e da noite, como Wadjet que é identificada com "a aparência do céu ao norte onde o sol nasce". Também possuem ligações com a terra, no caso, o Egito em termos de geografia. 
   Neste ponto, a concepção dos deuses assemelha-se ao helenismo e seu conceito de religião de pólis, onde vemos deuses/as sendo venerados e sagrados em determinados lugares em detrimento de outros. Thebas, a cidade de Bast e Mut; Abydos, cidade de Wesir.
    Entretanto, apesar do que possa parecer, o Kemetismo Ortodoxo não é uma religião de politeísmo, mas de monolatria. Atenção: monolatria é diferente de monoteismo, como no caso das religiões abraãmicas. No monoteísmo, há somente um deus, na monolatria, não. 
    Da mesma forma, também não somos henoteístas, onde afirmamos que o deus X é superior ao deus Y ou que determinado deus/a está acima dos outros deuses/as e que o culto de uma pessoa deve ser direcionado desta maneira. Como exemplo, cito o Odinismo dentro do Asatrú, que possui essa visão henoteísta.
     No Kemetismo Ortodoxo cremos em um princípio, Netjer. Netjer, ultra master do universo, não é feminino ou masculino. Então, aqui não cabe o conceito da Deusa Wicca ou de Javé, que é assumidamente, "Pai/Senhor".Netjer é tudo, o divino e sagrado. 
    Netjer apresenta-se com vários Nomes, Netjeru (deuses) e Netjeret (deusas) no panteão egípcio. São estes Nomes de Netjer os que personificam cada um dos seus aspectos separadamente. Assim, podemos interagir de uma maneira mais única e intensa, vivenciar e conhecer melhor o todo através de suas partes.
    Todos e um:Netjer.

12 de mar. de 2011

Você tem o relógio, eu tenho o tempo.

Este é um texto maravilhoso, link enviado pela Iony. Obrigada!
Espero que todos aproveitem a leitura como eu aproveitei.




" - Não conheço minha idade: nasci no deserto do Saara, sem endereço nem documentos…! Nasci num acampamento nômade tuareg entre Timbuctú e Gao, ao norte do Mali. Fui pastor dos camelos, cabras, cordeiros e vacas que pertenciam a meu pai. Hoje, estudo Administração na Universidade de Montpellier, no sul da França. Estou solteiro. Defendo os pastores tuaregs. Sou muçulmano, mas sem fanatismo. 
- Que turbante bonito! 
- É apenas um tecido fino de algodão: permite cobrir o rosto no deserto quando a areia se levanta e, ao mesmo tempo, você pode continuar vendo e respirando através dele. 
- Sua cor azul é belíssima… 
- Ela é a razão pela qual chamam a nós, tuaregs, de homens-azuis: o tecido aos poucos desbota e tinge nossa pele com tons azulados. 

- Como vocês produzem esse intenso azul anil? 
- Com uma planta chamada índigo, misturada a outros pigmentos naturais. O azul, para os tuaregs, é a cor do mundo. 
- Por que? 
- É a cor dominante: a do céu, a do teto da nossa casa. 
- Quem são os tuaregs? 
- Tuareg significa “abandonado”, porque somos um velho povo nômade do deserto, um povo orgulhoso: “Senhores do Deserto”, nos chamam. Nossa etnia é a amazigh (berbere), e nosso alfabeto, o tifinagh. 
- Quantos vocês são? 
- Cerca de três milhões, a maioria ainda nômades. Mas a população diminui… “É preciso que um povo desapareça para que percebamos que ele existia!” denunciou certa vez um sábio: eu luto para preservar o meu povo. 
- A que ele se dedica? 
- Ao pastoreio de rebanhos de camelos, cabras, cordeiros, vacas e asnos, num reino feito de infinito e de silêncio. 
- O deserto é mesmo tão silencioso? 
- Quando se está sozinho naquele silêncio, ouve-se as batidas do próprio coração. Não existe melhor lugar para quem deseja encontrar a si mesmo. 
- Que recordações da sua infância no deserto você conserva com maior nitidez? 
- Acordo com o sol. Perto de mim estão as cabras de meu pai. Elas nos dão leite e carne, nós as conduzimos onde existe água e grama… Assim fez meu bisavô, meu avô e meu pai… E eu. No mundo não havia nada além disso, e eu era muito feliz assim! 
- Bem, isso não parece muito estimulante… 
- Mas é, e muito. Aos sete anos de idade, já permitem que você se afaste do acampamento e descubra o mundo sozinho, e para isso lhe ensinam coisas importantes: a cheirar o ar, a escutar e ouvir, a aguçar a visão, a se orientar pelo sol e as estrelas… E a se deixar conduzir pelo camelo; se você se perde, ele lhe conduzirá onde existe água. 
- Esse é um conhecimento muito valioso, não há dúvida… 
- Lá tudo é simples e profundo. Existem poucas coisas no deserto, e cada uma delas possui grande valor. 
- Assim sendo, este mundo e aquele são bem diferentes, não é mesmo? 
- Lá, cada pequena coisa proporciona felicidade. Cada roçar é valioso. Sentimos uma enorme alegria pelo simples fato de nos tocarmos, de estarmos juntos! Lá ninguém sonha com chegar a ser, porque cada um já é. 
- O que mais o chocou ao chegar pela primeira vez na Europa? 
- Ver a gente correr nos aeroportos. No deserto, só corremos quando uma tempestade de areia se aproxima. Fiquei assustado, é claro… 
- Corriam para buscar suas bagagens… 
- Sim, devia ser isso. Também vi cartazes mostrando moças nuas: por que essa falta de respeito para com a mulher?, Perguntei-me… Depois, no Hotel Íbis, vi uma torneira pela primeira vez em minha vida: vi a água correr… e tive vontade de chorar. 
- Que abundancia, que desperdício, não é mesmo? 
- Até então, todos os dias da minha vida tinham sido dedicados à procura d’água. Até hoje, quando vejo as fontes e chafarizes decorativos que existem aqui, sinto uma dor imensa dentro de mim. 
- E por que? 
- No começo dos anos 90 houve uma grande seca, os animais morreram, nós adoecemos… Eu tinha uns doze anos, e minha mãe morreu… Ela era tudo para mim. Contava-me histórias e ensinou-me a contá-las bem. Ensinou-me a ser eu mesmo. 
- Que aconteceu com sua família? 
- Convenci meu pai a deixar-me frequentar a escola. Todos os dias eu caminhava quinze quilômetros para chegar até ela. Até que um professor arrumou uma cama para eu dormir, e uma senhora me dava comida quando eu passava em frente à sua casa. Entendi: era minha mãe que me ajudava… 
- De onde veio essa paixão pelos estudos? 
- Dois anos antes, o rally Paris-Dakar passou pelo nosso acampamento, e caiu um livro da mochila de uma jornalista. Eu o apanhei e devolvi a ela. Mas ela me deu o livro de presente e disse que ele se chamava “O Pequeno Príncipe”. Naquele instante prometi a mim mesmo que um dia seria capaz de lê-lo… 
- E você conseguiu… 
- Sim. Foi assim que consegui uma bolsa para estudar na França… 
- Um tuareg na universidade! 
- Do que mais tenho saudade é do leite de camela. E do fogo de madeira. E de caminhar descalço sobre a areia tépida. E das estrelas: lá, nós as admiramos todas as noites, e cada estrela é diversa da outra, como cada cabra é diversa da outra. Aqui, à noite, vocês ficam vendo televisão. 
- Sim. Na sua opinião, qual é a pior coisa que existe aqui? 
- A insatisfação. Vocês têm tudo, mas nada lhes é suficiente. Vivem se queixando. Na França, passam a vida queixando-se. Vocês se acorrentam por toda a vida a um banco por causa de um empréstimo, e existe essa ânsia de possuir, essa correria, essa pressa. No deserto não existem engarrafamentos, sabe por que? Porque lá ninguém quer passar à frente de ninguém! 
- Relate um momento de felicidade intensa que você viveu no seu distante deserto. 
- Esse momento ali se repete a cada dia, duas horas antes do pôr-do-sol: o calor diminui, o frio da noite ainda não chegou, homens e animais retornam lentamente ao acampamento e seus perfis aparecem como recortes contra o céu que se tinge de rosa, azul, vermelho, amarelo, verde… 


- É fascinante. E então… 
- Esse é um momento mágico… Entramos todos na tenda e fervemos a água para o chá. Sentados, em silêncio, escutamos o barulho da água que ferve… A calma toma conta de nós… As batidas do coração entram no mesmo compasso dos gluglus da fervura… 
- Que paz… 
- Aqui vocês têm o relógio; lá, temos o tempo."
 
Texto obtido daqui